quarta-feira, 28 de outubro de 2009

Osvaldo Montenegro - Metade



Que a força do medo que tenho
Não me impeça de ver o que anseio.
Que a morte de tudo que acredito
Não me tape os ouvidos e a boca
Porque metade de mim é o que eu grito
Mas a outra metade é silêncio.
Que a música que ouço ao longe
Seja linda ainda que tristeza
Que a mulher que eu amo seja para sempre amada
Mesmo que distante
Porque metade de mim é partida
Mas a outra metade é saudade.
Que as palavras que eu falo
Não sejam ouvidas como prece
e nem repetidas com fervor
Apenas respeitadas
Como a única coisa que resta a um homem inundado de sentimentos
Porque metade de mim é o que ouço
Mas a outra metade é o que calo.
Que essa minha vontade de ir embora
Se transforme na calma e na paz que eu mereço
Que essa tensão que me corrói por dentro
Seja um dia recompensada
Porque metade de mim é o que eu penso
Mas a outra metade é um vulcão.
Que o medo da solidão se afaste
e que o convívio comigo mesmo
se torne ao menos suportável.
Que o espelho reflita em meu rosto um doce sorriso
que eu me lembro de ter dado na infância
Porque metade de mim é a lembrança do que fui
E a outra metade eu não sei.
Que não seja preciso mais que uma simples alegria
Pra me fazer aquietar o espírito
E que o teu silêncio me fale cada vez mais
Porque metade de mim é abrigo
E a outra metade é cansaço.
Que a arte nos aponte uma resposta
Mesmo que ela não saiba
E que ninguém tente complicar
Porque é preciso simplicidade para fazê-la florescer
Porque metade de mim é platéia
E a outra metade é canção.
E que minha loucura seja perdoada
Porque metade de mim é amor
E a outra metade também.
Oswaldo Montenegro

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